Por
ocasião do Dia Nacional da Adoção, 25 de maio, venho escrever sobre casais e
famílias que desejam ampliar os seus vínculos adotando uma criança. Além da
grande fila para adoção no Brasil, da dificuldade do enquadramento no
perfil adequado para adotar, há aspectos psicológicos importantes a serem
vistos antes de se adotar uma criança. Pensemos sobre o desejo de alguém em
adotar e da acolhida de toda a família com a chegada da criança no novo lar.
Na
chegada de um filho biológico, existem várias características inconscientes que
interferem na gravidez e na esperança do seu nascimento. Devemos
considerar que cada pai e mãe tem uma história individual construída pela sua
vivência com os seus pais, cercada de fantasias, desejos e medos. Sobre a vida
desse filho, estão presentes as expectativas de cada parceiro sobre si mesmo,
sobre o que é ser pai, ser mãe e ser filho. A tendência é que os aspectos
conflituosos, as fantasias infantis e expectativas do casal e dessa família
sejam projetadas nesse novo membro da família. Os pais e familiares não
percebem a projeção e aos poucos, as expectativas podem se tornar realidade ou
não na vida da criança que acabou de nascer, confirmando ou negando as
fantasias, por exemplo, se a criança será perfeita ou não, com traços ideais ou
mal vistos pela família, se seguirá o futuro que os pais sonham.
Na adoção,
esses aspectos conflituosos e negativos são projetados com mais facilidade no
novo membro, uma vez que uma das formas de se sentir pertencente a uma família
é separando quem tem o "sangue" e quem não tem e criando uma
definição do que é comum e do que é estranho às pessoas que ali convivem. Quem
tem o sangue, faz parte da família e tem uma história de vida comum e quem não
tem a mesma história, está fora. A partir do sangue, muitos desentendimentos
são relevados, ou acordos são realizados para que durante os anos a união
aconteça dentro de uma casa. No caso da adoção, há quem não tenha esse mesmo
compromisso de familiaridade com a pessoa adotada. Os pais podem se sentir
inseguros se esse filho conseguirá perpetuar a história deles, as crenças
e percepções secretas dessa família, os mitos e costumes, o modo deles se
relacionarem entre eles, que por sinal seguem entre os anos, dando continuidade
natural ao legado que se pretende deixar.
Ainda,
o filho adotivo pode ser sentido como um remédio para a impossibilidade desse
casal não o ser pai e mãe de maneira natural, biológica. Assim, o filho pode
inconscientemente representar a falta de algo que teve de ser preenchido. De
outro modo, pode significar aquele foi "salvo" por aquela família
adotiva, sendo colocado no lugar de "abandonado" e daquele que é
denegrido, manchado. Podem existir outros sentimentos em relação a essa
criança, como a imaginação de que ela contém uma desordem da sua família de
origem que a seguirá com o seu desenvolvimento, o que torna essa criança alguém
mais uma vez desconhecida e estranha, aparentemente difícil de lidar.
Dessa forma, o adotivo é percebido como aquele que precisa de muitos mais
cuidados e assistência que uma criança "normal" e o que pode dar mais
"trabalho" para educar.
A
família pode nutrir dúvidas sobre a origem desse novo membro: quais suas
tendências genéticas, possíveis doenças, suas habilidades, tipo de caráter e de
personalidade. É comum se perguntarem "De quem pertence esse jeito da
criança? Quem ela puxou?" às vezes já esperando que apareça com o
tempo algo "com defeito", quando se surpreendem com características
brilhantes da pessoa adotiva. Isso acontece também porque a criança adotiva
veio de outra família, de outros pais e não dessa família em que todas as características
são conhecidas e exaltadas. Então fica a pergunta: "Será que o que não vem
de mim pode ser bom?"
Tanto
na família biológica como na adotiva, existem muitos sentimentos em relação aos
novos membros: se conseguirão manter a tradição familiar, se se adaptarão às
regras desse grupo e do que ainda está por vir quanto ao destino dessa família.
A gravidez é um período em que os pais têm tempo para elaborar a ambivalência
de sentimentos (amar e odiar, ter carinho e rejeição ao mesmo tempo) em relação
ao filho. Para os pais adotivos é necessário também que sejam vistos e
trabalhados todos esses sentimentos e expectativas que podem nem estar claros
na consciência, mas que são fundamentais para a qualidade do "ser
pai", "ser mãe" e da vida familiar com os novos membros.
Bibliografia recomendada:
TEIXEIRA, A. C. P. Adoção: um
estudo das motivações inconscientes. Ed.
Stiliano, 2000, 116 p.
Nenhum comentário:
Postar um comentário