segunda-feira, 25 de maio de 2015

Adoção - motivações familiares inconscientes


Por ocasião do Dia Nacional da Adoção, 25 de maio, venho escrever sobre casais e famílias que desejam ampliar os seus vínculos adotando uma criança. Além da grande fila para adoção no Brasil, da dificuldade do enquadramento no perfil adequado para adotar, há aspectos psicológicos importantes a serem vistos antes de se adotar uma criança. Pensemos sobre o desejo de alguém em adotar e da acolhida de toda a família com a chegada da criança no novo lar.


Na chegada de um filho biológico, existem várias características inconscientes que interferem na gravidez e na esperança do seu nascimento.  Devemos considerar que cada pai e mãe tem uma história individual construída pela sua vivência com os seus pais, cercada de fantasias, desejos e medos. Sobre a vida desse filho, estão presentes as expectativas de cada parceiro sobre si mesmo, sobre o que é ser pai, ser mãe e ser filho. A tendência é que os aspectos conflituosos, as fantasias infantis e expectativas do casal e dessa família sejam projetadas nesse novo membro da família. Os pais e familiares não percebem a projeção e aos poucos, as expectativas podem se tornar realidade ou não na vida da criança que acabou de nascer, confirmando ou negando as fantasias, por exemplo, se a criança será perfeita ou não, com traços ideais ou mal vistos pela família, se seguirá o futuro que os pais sonham.


Na adoção, esses aspectos conflituosos e negativos são projetados com mais facilidade no novo membro, uma vez que uma das formas de se sentir pertencente a uma família é separando quem tem o "sangue" e quem não tem e criando uma definição do que é comum e do que é estranho às pessoas que ali convivem. Quem tem o sangue, faz parte da família e tem uma história de vida comum e quem não tem a mesma história, está fora. A partir do sangue, muitos desentendimentos são relevados, ou acordos são realizados para que durante os anos a união aconteça dentro de uma casa. No caso da adoção, há quem não tenha esse mesmo compromisso de familiaridade com a pessoa adotada. Os pais podem se sentir inseguros se esse filho conseguirá perpetuar a história deles, as crenças e percepções secretas dessa família, os mitos e costumes, o modo deles se relacionarem entre eles, que por sinal seguem entre os anos, dando continuidade natural ao legado que se pretende deixar.

Ainda, o filho adotivo pode ser sentido como um remédio para a impossibilidade desse casal não o ser pai e mãe de maneira natural, biológica. Assim, o filho pode inconscientemente representar a falta de algo que teve de ser preenchido. De outro modo, pode significar aquele foi "salvo" por aquela família adotiva, sendo colocado no lugar de "abandonado" e daquele que é denegrido, manchado. Podem existir outros sentimentos em relação a essa criança, como a imaginação de que ela contém uma desordem da sua família de origem que a seguirá com o seu desenvolvimento, o que torna essa criança alguém mais uma vez desconhecida e estranha, aparentemente difícil de lidar.  Dessa forma, o adotivo é percebido como aquele que precisa de muitos mais cuidados e assistência que uma criança "normal" e o que pode dar mais "trabalho" para educar. 



A família pode nutrir dúvidas sobre a origem desse novo membro: quais suas tendências genéticas, possíveis doenças, suas habilidades, tipo de caráter e de personalidade. É comum se perguntarem "De quem pertence esse jeito da criança? Quem ela puxou?" às vezes  já esperando que apareça com o tempo algo "com defeito", quando se surpreendem com características brilhantes da pessoa adotiva. Isso acontece também porque a criança adotiva veio de outra família, de outros pais e não dessa família em que todas as características são conhecidas e exaltadas. Então fica a pergunta: "Será que o que não vem de mim pode ser bom?" 

Tanto na família biológica como na adotiva, existem muitos sentimentos em relação aos novos membros: se conseguirão manter a tradição familiar, se se adaptarão às regras desse grupo e do que ainda está por vir quanto ao destino dessa família. A gravidez é um período em que os pais têm tempo para elaborar a ambivalência de sentimentos (amar e odiar, ter carinho e rejeição ao mesmo tempo) em relação ao filho. Para os pais adotivos é necessário também que sejam vistos e trabalhados todos esses sentimentos e expectativas que podem nem estar claros na consciência, mas que são fundamentais para a qualidade do "ser pai", "ser mãe" e da vida familiar com os novos membros. 

Bibliografia recomendada: TEIXEIRA, A. C. P. Adoção: um estudo das motivações inconscientes. Ed. Stiliano, 2000, 116 p.


Nenhum comentário:

Postar um comentário